quinta-feira, 9 de agosto de 2012

O TOMBO



Não me esqueço daquele tombo,
do silêncio seguido de um sonoro
estrondo, de um barulho estranho
onde ao cair de um corpo fez-se
um doloroso conto, um dolorido
gemer transformado em canto.
Aquele tombo onde não danei
nem os cotovelos e nem o lombo,
onde machuquei sim, meu sono,
meu encanto. Maldito tombo
que todos os dias tira meu santo
sono, que ao invés de sonhos
dá-me pesadelos insanos, que
ao contrário do encanto, dos
contos e dos cantos fez de mim
louco e maluco como um molusco.
Estourei a rotula do joelho,
contundi além do queixo
aquele desejo.

O silêncio precedi o tombo
e o estrondo que sucede o desabar
de uma forma pouco humana
fez de minha desvairada gana
ruidosa gama de gemidos. Sim,
maldito foi aquele tombo, danoso
igualmente foi o tropeço que fez
ruir um tronco ao asfalto. Cai de
pileque em um sobrado velho
na Rua da Lapa, cai de cachaça,
cerveja e maconha, cai sem travesseiro
e nem fronha. Fui-me ao chão
de joelho, tronco e cotovelos,
fui-me beijar o pé direto de
uma cadeira, observar as pernas
rígidas de uma mesa, sim ao cair
conversei com sandálias, tênis e
sapatos. Sim tombei como um
morto tomba e sua tumba.

Para além do que canto,
para depois de meu conto
fiz um desenho onde transformei
em arte aquele tombo, onde quebrei
desejos e pretéritos, onde danei
meus sonhos de primavera,
onde desconfigurou-se depois
da queda a minha bela. O que
doeu no tombo não foi o corpo,
o gemido de dor fez-se
ao perceber que toda vez
ao tombar, que toda vez
ao cair, serei eu sozinho
e estatelado ao chão,
serei um corpo solitário a
levantar-se embriagado,
contundido de um passado.
Cai com um tombo e ao levantar
percebi que já não estava mais ali.

Eduardo Andrade do Nascimento.

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